domingo, julho 24, 2005

jardim do desejo



(Paulo Pinto, 2005)

o que somos e quem somos não depende de nós, depende dos outros. por nós, seríamos sempre os mais puros, amigos e honestos dos homens. mas, pelos outros, poderemos talvez ser outra coisa qualquer, longe da nossa realidade, mas perto da realidade de cada um deles. os outros. aqueles que nos julgam e nos imaginam monstros ou fadas, doces ou agrestes. no jardim do desejo eu gostava de ser aos olhos dos outros o que sou aos meus, mas estaria a ser castrador. o que eu serei, será sempre o que os outros pensarão de mim, por muito que me incomode. os meus medos são só meus, assim como o que eu penso de mim é só meu. no jardim do desejo desejo-te e quero-te e quero-te só para mim.

sexta-feira, março 11, 2005

Epígrafes

O sonho reaproveita "restos" do quotidiano. (Freud)

quarta-feira, março 09, 2005

Campo Magnético



(Paulo Pinto, 2004)

sábado, março 05, 2005

quarta-feira, março 02, 2005

sábado que passou

hoje caiu neve, pouca, é certo, mas caiu. hoje comprei o jornal como sempre compro ao sábado. hoje, curiosamente, não me apeteceu passear com a minha câmara fotográfica, como habitualmente ao sábado. não registei nenhuma imagem em silício, para além das que ficaram nos sais de prata da minha memória. as imagens onde fixo o meu olhar são as que sempre me ocorrem quando choro. hoje está frio. hoje não pensei porque o pensamento não é a razão, a razão é o sentimento. hoje nevou, mas não caiu neve. comprei o jornal e não o paguei, porque não gosto de pagar os jornais, como não gosto de os ler ao sábado. a minha câmara fotográfica não me compreende, mas tem razão porque não pensa. a minha memória sente-me e gosta de mim e eu dela. não gosto da minha memória porque me atraiçoa. para além da minha memória só o vendedor de jornais me conhece e me sente. é um bom homem o vendedor de jornais, porque sabe ver a neve onde mais ninguém a vê. hoje está frio e a as pessoas suam de tanto calor. sinto quente na minha câmara fotográfica porque nevou. hoje nevou e estou cansado, por isso não fotografei como habitualmente ao sábado.

terça-feira, março 01, 2005

Audições

Lyle Mays a solo.

Epígrafes

Na minha boca, mina de palavras e beijos, confundem-se pensamentos e desejos, reduzidos à expressão única da comunicação.

(Le Point Cardinal, Leiris)

mar de meu tempo

No barco, as marcas do tempo trazem de volta as memórias do mestre com quem aprendi a pescar. A saudade aperta, mas não há sequer tempo para viagens nas memórias. Lá, ao longe no mar, a dor crava-se na proa e arrasta-se, devagar. No mar só há um tempo. Esse tempo é um pássaro que voa livre e despreocupado e que permanece imperturbável, sem nos atribuir importância, pois para ele nós somos completamente indiferentes. O seu caminho continua o mesmo, numa viagem que não tem fim. Se nós nos esquecemos dele, ele continua a sua viagem e nós ficamos, por vezes sós, por vezes velhos, por vezes prisioneiros. O tempo dizima-nos, assim como o mar. Da faina sobra um vago cheiro conhecido, o do suor. Corpo que sofre perigos vários e nunca se pode negar. Resta-me o regresso apressado, pois curtas horas me sobram. Nesse instante apercebi-me que o tempo já não contava, que a minha felicidade interior era mais forte que a sua caminhada imparável. Por mais que o tempo corresse não conseguia transportar-me com ele. Eis-me chegado a terra...por fim, posso descansar.

domingo, fevereiro 27, 2005

João

Hoje nasceu o João. Estou feliz.

sábado, fevereiro 26, 2005

blue wall



(Paulo Pinto, Blue Wall 2003)

maria



maria, de olhar meigo e doce

quinta-feira, fevereiro 24, 2005

solidão

mesmo no silêncio de um grito
o homem liberta em si a necessidade de se relacionar

mesmo na solidão de um momento
o homem afunda-se na multidão que lhe vai no cérebro

Sinais



(Paulo Pinto, Sinais 2003)

Arte Povera ???

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

arte povera



(Jannis Kounellis, Untitled 1987)

vale a pena ler

Cadernos, Nijinski (Assírio & Alvim)

num registo dadaísta.....perturbador.

O livro que fez parar o tempo

O tempo parecia um pássaro voando livre e despreocupado. A vida tem destas coisas. Quando não damos pelo tempo ele permanece imperturbável, sem nos atribuir importância, pois para ele nós somos completamente indiferentes. O seu caminho continua o mesmo, numa viagem que não tem fim. Se nós nos esquecemos dele, ele continua a sua caminhada e nós ficamos, por vezes sós, por vezes velhos, por vezes prisioneiros. O tempo dizima-nos. Resolvi deitar-me e adormecer. Sabia que só uma destas acções era por mim controlada. Por muitas voltas que desse na cama, o sono era uma miragem. O meu corpo estava cansado e estranhamente leve. Apenas o suave brilho da Lua me distraía o pensamento, pois o corpo parecia não responder à gravidade. Sentia uma ausência total de matéria, mas o meu espírito enchera-se de uma energia invulgar, relegando para segundo plano um cansaço que deixara de o ser, mesmo por breves segundos. Naquele instante apercebi-me que o tempo já não contava, que a minha felicidade interior era mais forte que a sua caminhada imparável, que por mais que o tempo corresse não conseguia transportar-me com ele. Teria eu conseguido pará-lo ? Estaria eu a alhear-me mais uma vez do mundo ? Como não adormecia, peguei de novo no livro que serenamente repousava junto à cabeceira da minha cama. Apesar de não o ter marcado, rapidamente localizei a última página lida. É suposto as marcas servirem para tal, mas aquele livro as dispensara. Tinha começado a folheá-lo pouco tempo antes, no início da madrugada, e reparei que em poucos minutos estava a pouco mais de um terço do seu final. Por momentos desejei não o concluir. As imagens não paravam de rodopiar na minha mente, transformada num carrossel de uma festa repleta de crianças e homens de bom coração. Os homens de bom coração ofereciam gelados às crianças e as crianças prendavam os homens de bom coração com um sorriso infindável, que de tão puro e irradiante deixava os homens com vontade de voltarem a ser crianças, para poderem receber gelados de outros homens, necessariamente de bom coração. Tento não desviar a minha atenção das imagens. Aquela cabana junto ao mar aí permanecia. Também te amo Jacira. Senti na minha mão a forma cilíndrica da flauta do João «Castor», e também segurei umas quantas lágrimas que teimavam em pesar mais do que a minha própria vontade. Também eu vi os raios de luz que desciam da árvore...e calei-me. Haverá alguém que acredite em raios de luz emanados de árvores para além daqueles que os conseguem ver ? Mesmo nunca tendo feito surf, tive a certeza que me libertaria, e o mar receber-me-ia em sua casa, sem se sentir invadido. Tinha conseguido parar o tempo. Aquele tempo que nos dizima tinha sido reduzido a um simples grão de areia. Talvez estivesse junto a outros grãos, colados na ponta da cana do João, com a qual tinha feito os desenhos na areia molhada daquela praia. Resolvi olhar de perto os seus desenhos, na esperança de que a água não se tivesse encarregado de os apagar. Ao aproximar-me do local onde tinham sido feitos, reparei que já não existiam, ao mesmo tempo que senti o meu coração a bater tão forte que pensei ser um sonho. E o sonho era real. No momento em que terminasse a minha leitura, também terminaria o sonho, embora soubesse que não o podia evitar. Ao concluí-lo, senti de novo o cansaço de todos os dias, vi de novo as pessoas que não acreditam em raios de luz, mas fiquei feliz.....porque sei que hei-de voltar a sonhar. Agora, quando o quiser fazer, quando quiser respirar de um ar que me acalma, quando quiser aprender nas palavras dos outros o que por vezes teimo em esquecer, bastar-me-á abrir aquele livro....o que fez parar o tempo.

pontuação póstuma

gostava de não te entender para te questionar
gostava de te perder para te reaver
na vida só damos valor às coisas que não temos
numa espécie de consciência póstuma
este patamar de insatisfação é tão somente
o produto daquilo que eu fui e já não sou
e serei sempre assim
..,,.,..

terça-feira, fevereiro 22, 2005

sombra de mim



junto a ela vagueio fugindo à exaltação
a luz que me fere os sentidos já vai baixa
e prolonga a sombra para além do mar

nela me afogo e cego de tanta exaustão
o que não quero rejeito até mais não poder
sombra minha sombra de eterno esconder

sombra molhada pelo mar de lágrimas
brotadas como pedras salgadas
humilde existência pretendo ser

a luz que se apaga não desiste nunca
em dias seguintes me ferirá contínua
sem ela a sombra desfaz-se perdida

sombra de mim sombra de mim

Vale a pena ler

"Portugal Hoje...O Medo de Exisitir" de José Gil.
Aconselho a crítica de David Soares no seu blog

domingo, fevereiro 20, 2005

Diário de sombras e outras luzes

.

Sinto

Sinto-o. E tu vês a minha pele
ou o meu olhar, no teu rosto

Adormeço com o eco silencioso
das tuas palavras. Ora minhas.

a maneira menos certa do olhar
meu e teu, juntos, certos, certos.

o meu rosto é meu, sinto-o.

Epígrafes

Palavras

as tuas mãos, ou a tua pele, ou os teus lábios.
o teu olhar. o teu olhar lembra-me sempre que

ou os teus cabelos, ou a maneira exacta como
o teu rosto. o teu rosto. ou o teu corpo que
adormece onde o vento não se esqueceu de

ou cada uma das tuas palavras, palavras,
palavras numa língua de céus impossíveis.

(José Luís Peixoto, A Casa, a Escuridão)

Epígrafes

Je m'endors...

Je m'endors avec des oiseaux plein les yeux
Et je rêve d'un jardin
Mais si tes yeux sont loin des miens
Je m'endors avec des larmes plein les yeux
Et mon rêve s'apelle: chagrin.

(J.Prévert, Soleil de nuit)

Dominho de manhã

Hoje é Domingo de manhã. Daqui a pouco não o será. Daqui a pouco será um turbilhão de palavras inócuas, de promessas rotas. Daqui a pouco haverá festa, daqui a pouco definharemos mais um pouco. Hoje perdemos mais uma batalha. Os pássaros são felizes, as focas também e os insectos não se incomodarão nunca. Daqui a pouco serei mais um....deles.

sexta-feira, fevereiro 18, 2005

Espelho

Epígrafes

Et le surveillant dans la nuit
S´est éteint aussi
Les enfants en rêvant
Avaient soufflé sur lui.

(Prévert, 1996).

Domingo de manhã

Vale a pena ver, no Silo da FNAC de Matosinhos, a exposição fotográfica de Jorge Henriques. Até Março. Nós vimos, e que bom que foi.

quarta-feira, fevereiro 16, 2005

Epígrafes

Rano Raraku

Como o mundo é belo
A Grécia nunca existiu
Não passarão
O meu cavalo acha a ração na cratera
Homens-pássaros remadores arqueados
Voaram-me em volta da cabeça porque
Também sou eu
Quem lá está
Atolado a três quartos
A troçar dos etnólogos
Na amena noite do Sul
Não passarão
A planura não tem fim
Quam se destaca é risível
As altas imagens caíram

(A.Breton, Xénophiles 1948)

Afinidades

Nesta imagem me sinto, entrando na sala onde se me riem as pessoas, eu contente de tanto de mim, triste por ser teu manto de prosas, enrolado e esquecido, por debaixo de rosas. Entrando, fico à porta onde me recebem de braços abertos e sorrisos certos. Por onde me deixo sair, triste e velho de tanto desdenho. Triste me fico, contente de mim.

AQUI

Epígrafes

As duas ou três vezes que me abriram
A porta do salão onde está gente
Eu entrei, triste de mim, contente
E à entrada sempre me sorriram...

(Mário de Sá-carneiro, 1915)

terça-feira, fevereiro 15, 2005

Epígrafes

A Terra é azul como uma laranja (Éluard).

Nascemos

Hoje nascemos, dentro do sonho, numa criação colectiva que se pretende forte, unificada, onde a diferença e incompatibilidade se desfaz. O sonho reaproveita "restos" do quotidiano (Freud). O quotidiano é feito de sonhos, epígrafes....de Prévert e Desnos. Hoje nascemos envoltos em sonhos.

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